terça-feira, 23 de agosto de 2011

O mês sagrado

Ponto de vista - 23 ago. 2011

O destaque do blog hoje é o artigo de Cristina Ruiz Kellersmann, intitulado "Ramadã ", na coluna "Pelo Mundo", publicado na página 2 do "Segundo Caderno" d'O GLOBO. Trechos, na verdade.

A jornalista, que escreve sobre a vida cultural de Berlim - a capital alemã - nos dá uma aula sobre o mês sagrado dos muçulmanos e seu cotidiano. O grifo é nosso:



"[...], a religião islâmica se destaca com uma fatia de quase 10% da população local [de Berlim]. A presença muçulmana se torna mais visível na cidade no período do Ramadã. Em bairros com alta densidade de muçulmanos (Kreuzberg Wedding e Neukölln), as padarias anunciam o ramazan pidesi (o pão do Ramadã). Os supermercados turcos têm promoções especiais e distribuem calendários festivos com os horários do nascer e do pôr-do-sol. Tarde da noite, ainda se veem as numerosas famílias circulando, o que não é comum em outras épocas, indo e voltando da casa de parentes.
[...]
Estamos na última semana do Ramadã, a festa mais importante do Islã. Comemorada no nono mês do calendário islâmico, ela tem como referência o calendário lunar e por isso acontece em data diferente a cada ano.

O jejum é o componente mais importante do Ramadã. Os muçulmanos não podem ter sexo, fumar, comer ou beber nada, nem água, enquanto houver luz do sol. Acredita-se que através do exercício do autocontrole, possa se desenvolver a gratidão, o aprendizado de valorizar mais aquilo que se possui, a compaixão pelos pobres e ainda o fortalecimento de um vínculo com Deus (Alá). É um momento de reflexão e uma época para aplicar os ensinamentos do Alcorão.

O ritual começa cedo, antes do dia clarear. As mães de família têm um dia a dia bastante movimentado no Ramadã. Com as noites mais curtas nesta época do ano, elas mal têm tempo para dormir, pois é na madrugada que se prepara a primeira refeição do dia, sohour. Depois do nascer do sol, quando todos saem de casa, é a hora do silêncio, um momento de descanso, antes de começar os preparativos do atar, a próxima refeição. A temporada do Ramadã se encerra com uma celebração de três dias. É o equivalente ao Natal dos cristãos. As crianças ganham brinquedos, roupas e guloseimas.
[...]
Há também muçulmanos que só celebram o Ramadã quando estão em seu país. É o caso de Sedai Sardan, que mudou-se para a Alemanha em 1974, aos 14 anos, e hoje é dono do clube de jazz A-Trane. "Em Berlim, não há tradição, o Ramadã diluiu-se, perdeu o sentido. Celebrar é estar com amigos e familiares, ajudar um ao outro e aqueles que necessitam. É preciso recuperar a beleza do Ramadã, e não praticá-lo como obrigação. Na minha infância, o jeito de celebrar era bem diferente. Não havia Internet e nem celular. O Ramadã era a razão para estarmos juntos", contou Sedai relembrando os tempos de garoto.

Em Berlim há muitos restaurantes e lanchonetes de comida turca. Estes estabelecimentos não fecham por causa do Ramadã. Os funcionários estão acostumados a estarem ali, cozinhando, servindo e sentindo o cheiro da comida sem poder comer. Ninguém para de trabalhar ou deixa de ir à escola. Mas não há dúvida de que se trata de um período especial. Todo dia é dia de uma refeição farta e coletiva depois que o sol se esconde. E mesmo sem ser devoto e ter jejuado o dia inteiro, é possível participar de uma quebra de jejum.

O mês do Ramadã é uma época de encontros e abertura de diálogos. A agenda cultural da cidade oferece concertos, filmes e discussões em torno da cultura muçulmana. Na política, acontecem eventos reunindo representantes da comunidade e chefes políticos. As noites do Ramadã são definitivamente motivo para celebrar. Começam com a quebra do jejum e sempre terminam em festa!
".

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