Ponto de vista - 22 ago. 2011
Destaco da leitura diária do jornal, a matéria assinada por Carlos Alberto Teixeira, intitulada "Para que serve isso mesmo?", na página 19 d'O GLOBO. O jornalista relata - citando vários exemplos de consumismo - que a grande maioria dos usuários é seduzida pelas novidades tecnólogicas com suas mil e uma utilidades (e pelas campanhas publicitárias); mas que, no final, acaba pagando por aquilo que na verdade não consome - porque não consegue aprender ou, na verdade, não encontra necessidade. O grifo é nosso:
"A esmagadora maioria dos aparelhos informáticos e eletrônicos é vergonhosamente subutilizada e os exemplos estão por toda parte. Basta procurar no seu círculo mais próximo de amigos quanta gente possui celulares e smartphones às vezes de último tipo, caros e cheios de funcionalidades, mas que usa o aparelho para falar e, no máximo, enviar mensagens de texto.
Rosane Garcia, 37 anos, morando na Suécia e trabalhando como pesquisadora em economia imobiliária no Instituto Real de Tecnologia, é um desses exemplos.
— Comprei meu iPhone 3G5 em abril de 2010 e tenho um plano de assinatura por 24 meses. Por isso, mesmo se eu quisesse me livrar dele, teria que continuar pagando até o restante do plano. Com toda certeza, meu próximo aparelho será algo bem básico, pois sei que não utilizo todas as funções existentes neste celular — conta ela. — A única função futura que vejo para meu iPhone é utiliza-lo mesmo como "air mouse" para controlar o meu servidor de mídia, montado em um Mac Mini.
Quem alimenta o fenômeno é a própria indústria, que, com maciças campanhas publicitárias nas várias mídias, induz o consumidor a comprar coisas de que ele, na verdade, não precisa — badulaques cheios de perfumarias e funções adicionais, muitas vezes supérfluas, de que ele jamais chegará nem perto.
—As grandes empresas de tecnologia, mobilidade e telecomunicações estão aos poucos se tornando donas de nossas emoções e, consequentemente, de nossos desejos — diz Evaristo Santiago, aposentado pelo INT (Instituto Nacional de Tecnologia) e ex-gerente de TI da Comissão Nacional de Energia Nuclear. — Basta ver o caso da Apple. Assim que ela lança um iPhone novo, quase todos os donos do modelo antigo já ficam com sede de consumo, mesmo não tendo aprendido a usar nem metade dos recursos do aparelho anterior.
Serviços também subutilizados
O setor de serviços também tem representantes da casta dos chamados "underusers". Clientes de TV por assinatura, se não forem os campeões na categoria, são fortes candidatos.
— Meu genro instalou anos atrás para mim uma TV a cabo com centenas de canais com filmes e documentários. Tem até televisão do Japão e da Alemanha, e uma penca de outros canais só de canções e música de todo tipo — desabafa Célia Vieira da Cruz, 89 anos. — Achei fofa a atitude dele, mas nem novela eu acompanho. Sou muito religiosa e assisto um único canal: o Rede Vida.
É comum também encontrar usuários que pilotam computadores de último tipo — desktops ou notebooks — equipadíssimos com os melhores e mais caros periféricos, e com conectividade em banda larga de dezenas de megabits por segundo, mas que usam a potência da máquina para tarefas simples.
Marlene Nelson da Silva, dona de casa de 72 anos, é outra "underuser" doméstica típica na categoria de produtos de informática.
— Tenho em casa um computador desses de mesa cheio de aparelhos pendurados nele. Tem um monitor de alta resolução. CPU com processador veloz, memória aos borbotões, roteador sem fio e um disco rígido gigantesco. Mas só uso o aparelho para digitar textos esporadicamente e ler e enviar e-mails. Pen drive? Já ganhei um. Mas fica parado na gaveta — confessa.
Excessos até na cozinha
A síndrome da subutilização não se restringe ao escritório e à sala de estar, local que muitas vezes abriga um home theater estalando de novo, cheio de capacidades avançadas, mas que o dono só usa para as funções básicas de tocar CD e ouvir rádio FM. O mal se alastra para as outras dependências do lar, como a cozinha, onde não é raro ver um forno de micro-ondas com mil funcionalidades, mas usado apenas para esquentar leite e fazer pipoca. Ou um daqueles multiprocessadores, capazes de fazer até suco de pedra, mas que só se usa para picar cebola.
Ter algumas economias paradas é um ponto que ajuda a cometer exageros na compra de itens tecnológicos. A socióloga Fátima Costa, 43 anos, enveredou pelas bandas da fotografia, exagerando um tanto na sofisticação de suas compras.
— Além de iPad e iPhone, comprei um ótimo equipamento fotográfico de uns R$30 mil, e o pus até no seguro. Participo de um grupo de fotografia, o Photoconversa, que funciona na empresa onde trabalho. — conta Fátima. — Mas tenho plena consciência de que uso pouquíssimos recursos de minha câmera Canon 5D Mark II, com objetiva 24-105mmL.
Luiz Ricardo Poell, médico do trabalho, é outro que tem vários relatos de subutilização de dispositivos.
— Sou o perfeito mau usuário de vários apetrechos eletroeletrõnicos: celular, micro-ondas, TV de LED novinha e o super-rádio do meu carro — diz Poell. — Mas o campeão é o meu relógio Citizen que tenho desde 1997 e que nunca enguiçou. O bichão oferece dezenas de funções que até hoje não consegui acessar, mas também nunca precisei de nenhuma delas. Sempre que preciso mexer no horário de verão, apelo para um experiente relojoeiro que insiste em tentar me ensinar a manejar aquela "botãozada" toda, só para atrasar ou adiantar os ponteiros em uma hora. Ele deve me achar um quadrúpede de relógio".
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Você é um desses? Que exemplos, seu ou de pessoa próxima, você pode nos contar?
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